A aprovação do projeto de lei que estabelece o 28 de abril como dia nacional da conscientização sobre a doença de Fabry pode ser uma arma importante na antecipação do diagnóstico e na realização do tratamento adequado ao paciente. Assim entendem os especialistas e profissionais de saúde que participaram de audiência pública na Comissão de Educação e Cultura (CE), nesta quarta-feira (7).
A adoção da data no calendário nacional e a criação de uma programação com ações específicas, segundo eles, farão com que a população em geral e, principalmente, os profissionais de saúde e gestores públicos dediquem-se a desenvolver medidas para melhorar a qualidade de vida dos pacientes afetados.
A doença de Fabry é uma patologia rara, genética, que atinge vários sistemas do organismo. É caracterizada pela deficiência ou a ausência de uma enzima que ajuda na liberação de substâncias geradas nas células. As áreas mais afetadas pelo acúmulo dos resíduos nos tecidos são a pele, o coração, os rins e o sistema nervoso central. As principais causas de mortalidade são ocasionadas por insuficiência renal e cardíaca.
O projeto ( PL 5.984/2019 ) para instituir a data como o dia nacional de conscientização sobre a doença tramita na CE e tem como relator o requerente da audiência pública, senador Dr. Hiran (PP-RR). Como médico oftalmologista, ele reconheceu que mesmo entre os profissionais de saúde há desconhecimento sobre essa condição rara e destacou a necessidade de mais educação e recursos para identificar e tratar a doença adequadamente.
— Mesmo entre nós médicos há um desconhecimento dessa doença. Eu só tinha ouvido falar da doença de Fabry porque eu sou oftalmologista e por conta da córnea verticilata [deficiência da enzima alfa-galactosidase A], mas eu confesso que quando a autora desse projeto, nossa colega médica, a deputada Mariana Carvalho (PSDB-RO), me falou da doença eu confesso que fui estudar um pouco porque eu nem me lembrava mais de como que era o diagnóstico e não sabia que nós tínhamos uma reposição enzimática já disponível no Sistema Único de Saúde (SUS).
A doença foi descrita pela primeira vez em 1898, pelos médicos William Anderson, da Inglaterra, e Johannes Fabry, da Alemanha.
A coordenadora do Comitê de Doenças Raras da Sociedade Brasileira de Nefrologia (Comdora-SBN), Maria Helena Vaisbich, destacou os impactos da doença na qualidade de vida dos pacientes. Ela explicou que, em razão do diagnóstico tardio, a condição da maioria dos pacientes é debilitante e afeta diversos órgãos do corpo, incluindo coração, rins e o sistema nervoso. Segundo ela, os sintomas incluem crises de dor intensa, comprometendo a capacidade dos pacientes de realizar atividades cotidianas.
Para Maria Helena, o dia nacional de conscientização vai ajudar no desenvolvimento de políticas públicas para ampliar o conhecimento sobre a doença entre profissionais de saúde e na comunidade em geral, para a criação de protocolos estabelecidos de investigação diagnóstica, tratamento e monitoramento e melhorar a alimentação de dados do Registro Brasileiro de Doença de Fabry.
Segundo ela, é fundamental a otimização do tempo para diagnóstico e tratamento, especialmente dentro da janela terapêutica previamente ao acometimento irreversível, sobretudo dos órgãos nobres do organismo.
— É uma doença genética que quando ela começa, esses depósitos [de substâncias geradas nas células] já começam desde o intraútero. Mas se a gente conseguir detectar os depósitos precocemente nós vamos ter uma pequena quantidade de depósitos e essa patologia é reversível. Entretanto, sem diagnóstico, sem sem o tratamento, vai havendo um aumento de depósitos até que nós tenhamos uma lesão irreversível daquele órgão comprometido, e infelizmente vai levar à falência desses órgãos. Infelizmente é quando nós temos feito o diagnóstico, principalmente dos nossos pacientes aqui no Brasil — alertou.
Segundo dados do Registro Brasileiro de Fabry, realizado pelo Comdora, são acompanhados atualmente no Brasil 114 casos da doença. No entanto, o número não representa a realidade, já que há casos não catalogados. Segundo os debatedores, a ausência de números reais dificulta o tratamento precoce com a reposição de terapia enzimática e o aconselhamento genético entre as famílias da doença hereditária.
— Há pouco conhecimento, há dificuldade no diagnóstico, tanto do ponto de vista clínico quanto de exames laboratoriais genéticos, dificuldade de acesso a exames e poucos centros de referência especializados no Brasil — destacou o diretor do Centro de Aconselhamento e Laboratório Genetika, o médico geneticista Salmo Raskin.
Outra dificuldade apontada pelos especialistas como entrave à reversão da doença é o acesso à reposição de terapia enzimática. Segundo os profissionais de saúde, os tratamentos são feitos por meio de judicialização, tanto pelo SUS como pelos planos de saúde, o que dificulta a possibilidade de reversão do quadro.
— É importante disponibilizar mais acesso a esses exames. Nós queremos que os diagnósticos sejam feitos com mais velocidade para que possamos atuar de forma mais efetiva em relação aos pacientes — defendeu o vice-presidente da Associação Renal Vida, o médico nefrologista Roberto Benvenutti.
A doença de Fabry tem uma prevalência de 1 em cada 40 mil nascidos vivos no mundo, e a expectativa de vida é geralmente encurtada em 20 anos nos homens e 15 anos nas mulheres. O Brasil tem tem a Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doenças Raras coordenada pelo SUS. Os participantes da audiência defenderam mais incentivo e o fortalecimento dessa política.
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